domingo, 21 de agosto de 2011

Cores de parto


O que eu vi,
À nascença, foi o céu.

No rasgão da retina,
A desatada luz: o meu segundo oceano.

Aprendi a ser cego
Antes de, em linha e em cor,
O mundo se revelar.

O que depois vi,
Ainda sem saber que via,
Foram as mãos.

Parteiros gestos
Me ensinaram quanto,
Das mãos,
A vida inteira vamos nascendo.

As mãos foram,
Assim, o meu segundo ventre.

Luz e mãos
Moldaram a impossível fronteira
Entre oceano e o ventre.

Luz e mãos
Me consolaram
Da incurável solidão de ter nascido.

Mia couto
In “Tradutor de chuvas”